domingo, 29 de novembro de 2009

Diário de Claire Bradfall - Parte 1 - Ruína.

Claire Bradfall é uma dessas garotas adolescentes que precisam tudo ao seu redor como ela espera. Uma casa aconchegante para que possa passar o dia, amigos perfeitos para que possa sempre se divertir com eles ou para contar sobre a sua vida, algum hobbie para que se distraia de pensamentos ruins ou da monotonia que a vida pode oferecer às vezes e, principalmente, de um amor que a faça suspirar antes de dormir e agradecer por um dia maravilhoso.

Ela possuía tudo isso... até ontem. Como todas essas coisas podem sumir de uma hora pra outra e transformar Claire em alguém inobservada? O que teria Claire feito com todos ao mesmo tempo ou que raios estava o mundo planejando pra ela? Todas aquelas questões apareciam para Claire fulminantemente naquele instante enquanto ela caminhava na rua. Ela estava atrasada para a ginástica. E enquanto ela caminhava mecanicamente em passos seguros com um rosto confiante, em sua cabeça tudo estava inquieto.

Ela subiu as escadas da academia, cumprimentou todos os funcionários como se sua vida maravilhosa ainda estivesse acontecendo e se dirigiu à esteira, onde passaria trinta minutos alternando entre correr e andar rápido para queimar as poucas gorduras que seu corpo tivera armazenado nos recém-acabados jantares entre amigos e seu amor. Ela esperava que junto com a gordura, fosse embora toda aquela poeira que estava em sua vida, que ela pudesse sair dali e ouvir o toque do seu telefone com a ligação de um de seus amigos ou do seu pretendente e então se pôs a fazer o exercício esperançosa. Nada do esperado aconteceu.

Agora era a vez dos músculos. Das aulas de spinning às sessões de pilates, Claire ainda ansiava pelas ligações ou por uma mensagem que fosse. Novamente, nada aconteceu. Seu sorriso agora era mera máscara da tristeza, era a forma de seu corpo e mente reagirem ao ver seu mundo perfeito cair repentinamente, sem nenhuma explicação ou motivo. Era seis horas e o crepúsculo começava a se fazer no horizonte dificultando a visão de Claire, que usou isso como um pretexto para pôr o seu óculos-escuro. Ela só queria um pouco de atenção de quem quer que fosse, uma ligação que fosse, um ‘vamos sair?’ que fosse... mas não, não iria acontecer. Já fazia três semanas daquele inferno moderno.

Tentou se distrair com algum livro, mas como se a cada cinco palavras ela era surpreendida com alguma situação inventada por ela própria, onde algum de seus amigos vinha busca-la pra sair ou onde o cara que ela gostava estivesse a abraçando, dizendo que a ama, encerrando a frase com um beijo na testa. Desistiu do livro. Desistiu da sua força interior e do seu humor que outrora agradava a todos. Agora era só mais uma dessas mulheres a quem sempre criticava, uma dessas mulheres inóspitas e sem vida, que fazem da tevê a sua melhor amiga ou que trata o seu ídolo como cônjuge, sem que o ídolo nunca a tenha conhecido.

Não sabia mais se se tratava com indiferença ou raiva. Tudo que ela tentava aparentar ao mundo era que estava bem, como todos sempre a viam. Um sorriso no rosto, cabelos bem arrumados, bem vestida e com conversas rápidas radiantes, sempre encerradas com um ‘eu preciso de água’ e a fuga ao aparelho de água mais próximo. Ou mesmo indo ao banheiro, esperando que ninguém a fosse incomodar enquanto estivesse mirando o espelho e vendo ali a primeira lágrima que brigava com o seu olho para que a deixasse sair, mas não... nunca a deixaria. A Claire ainda sobrava a força inatada das mulheres fortes, quase viris, que precisam tratar a tristeza como se ela não existisse.

E então, na hora de dormir, sempre esperava que todos já estivessem em seus sonhos para que ela pudesse refletir sobre seu pesadelo real. Quase sempre, se conectava no seu MSN e ansiava desesperadamente por alguém que puxasse conversa, mesmo que tola, mas que tivesse, ao menos, condição de ser levada adiante. E uma vez perdida no silêncio que o alerta do messenger fazia quando ninguém falava, ela procurava por algum site de compras, onde se ocuparia de desejar alguma coisa que fosse mais próxima de ter e que ocupasse a sua insatisfação pessoal. E uma vez sem financiamento para tal, acessava perfis em sites de relacionamento onde julgava quem poderia ser seu próximo parceiro, quem poderia ser um novo amigo e quem qualquer coisa. Ela só fazia isso para desviar o pensamento da sua tragédia real.

Por fim, já esgotada dessas atividades, deitava-se na cama no quarto escuro, mal iluminado pela luz do corredor que ousava entrar pela porta entreaberta do quarto. E estando acomodada em seu travesseiro perfumado, uma lágrima, aquela mesma que brigava para se libertar dela desde o início do dia, finalmente sai, trazendo consigo um suspiro de como quem vai começar um choro em Claire. ‘Seja forte!’ - dizia ela para si mesma – ‘Seja forte...’.

E rezou para que o próximo dia fosse agradável para sua família e para as pessoas ao seu redor. Já tinha desistido da sua felicidade. E pediu para que, se não fosse tanto trabalho, que não acordasse jamais.

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